O impacto da pandemia nas locações comerciais e residenciais

A pandemia da COVID-19 trouxe à vida de todos nós e à economia mundial efeitos nefastos.

Um dos reflexos vistos na economia foi a pública e notória elevação do IGP-M/FGV, índice largamente utilizado para reajuste de alugueis em contratos de locação.

Não há qualquer imposição legal para o uso do IGP-M como índice de correção dos alugueis, mas ele acabou caindo nos usos e costumes.

Nos 12 meses anteriores a setembro de 2021, foi possível notar que o IGP-M registrou uma elevação de aproximadamente 25%, enquanto o IPCA assinalou alta de 10,25% e o INPC de 10,78%. É o maior índice acumulado dos últimos 20 anos.

O IGP-M é fortemente influenciado por setores que em nada comunicam com o setor imobiliário, como os preços dos insumos para a produção e das commodities globais, e ao dólar, os quais sofreram enormes reflexos mundialmente em razão das medidas restritivas impostas pelos governos em decorrência da pandemia.

É natural que haja certa oscilação nos indexadores econômicos, mas o que ocorreu com o IGP-M nestes últimos anos em decorrência da pandemia foge em absoluta da normalidade e do que se era esperado pelas partes numa determinada relação de locação. A alta inesperada do índice fez com que os aluguéis subissem demasiadamente, tornando a prestação de uma das partes, no caso o locatário, excessivamente onerosa, e a da outra parte extremamente vantajosa.

Nessa situação, deve prevalecer o bom senso do mercado e todos precisam entender e negociar, a fim de trazer de volta o reequilíbrio à relação entre inquilino e proprietário. Ninguém melhor que as próprias partes envolvidas, conhecedoras do negócio, para se ajustarem de modo a chegar a uma melhor solução que atenda a todos. Afinal, se de um lado o locatário quer garantir a sobrevivência de seu negócio, de outro, o locador, também deseja manter a locação e assim evitar a vacância de seu imóvel.

A ideia, aqui, é a celebração de aditivos aos contratos de locação, seja para alteração do IGP-M por outro índice mais condizente com a realidade, como o INPC ou IPCA, por exemplo, seja para a concessão de efetivos descontos nos alugueis.

Há, no entanto, situações em que essa composição amigável se torna impossível, havendo a necessidade de se procurar o Judiciário para resolução da questão.

A revisão do valor do aluguel se justifica em nome da teoria da onerosidade excessiva, prevista no Código Civil. Se o equilíbrio do contrato se rompe, causando lesão enorme a uma das partes em decorrência de circunstâncias supervenientes à celebração do pacto e imprevisíveis a qualquer pessoa comum – como, exatamente, se vê na crise enfrentada hoje em decorrência da pandemia mundial – é lícito à parte prejudicada pleitear, em juízo, o restabelecimento das condições de modo a permitir o reequilíbrio contratual.

Além disso, as normas gerais de revisão contratual previstas no Código Civil também devem ser aplicadas, tais como, além da teoria da onerosidade excessiva, a da imprevisão e o princípio da boa-fé objetiva, a permitirem a revisão forçada dos contratos de locação diante dos eventos imprevisíveis e extraordinários que afetaram a vida da população ao redor do mundo e que ainda hoje trazem reflexos às nossas vidas.

Embora esse questionamento seja absolutamente plausível, o que vemos em nosso Poder Judiciário é uma clara divisão:

(a) os que admitem a revisão com base nas razões acima (onerosidade excessiva, teoria da imprevisibilidade e boa-fé), também havendo decisões que defendem que os reflexos da pandemia se caracterizariam como exceções à aplicação do princípio da mínima intervenção do Estado nos contratos, a permitir, portanto, a intervenção do Judiciário no que foi livremente pactuado entre as partes; e

(b) os que não admitem a revisão, sob o fundamento de que a imprevisibilidade atingiu a todos, inclusive aos proprietários dos imóveis, que, portanto, não podem amargar sozinhos os prejuízos.

Também há decisões neste mesmo sentido e que impedem a revisão dos contratos apoiadas no princípio da mínima intervenção do Estado nos contratos, na liberdade contratual e “pacta sunt servanda”. Os reflexos da pandemia não se caracterizariam, portanto, como causas a ensejar a intervenção do Judiciário nos contratos.

Importante pontuar que, atualmente, há em trâmite perante o STF as ADPFs ns. 869 e 818, ainda não julgadas, onde se pleiteia a “interpretação conforme a Constituição aos artigos 317 do Código Civil e arts. 17 e 18 da Lei nº 8.245/1991, para estabelecer a interpretação segundo a qual o reajuste dos contratos de locação residencial ou não-residencial deve se realizar por intermédio da aplicação do IPC-A, em substituição ao IGP-M (ou ao IGP-DI), ainda que previsto contratualmente; (c.2) subsidiariamente, determine a aplicação, durante a pandemia do coronavírus, do IPCA para reajustar os contratos de locação residencial e não residencial, pronunciando a ilegitimidade constitucional do conjunto de decisões que determinam a aplicação do IGP-M (ou IGP-DI), previsto contratualmente”.

Por fim, e inobstante o posicionamento do Judiciário a respeito do tema, não recomendamos o ajuizamento de demanda revisional dos contratos de locação nas seguintes hipóteses:

  • sem que antes se tenha tentado substituir o índice de maneira amigável. Ou seja, é essencial a existência de prova de que foi tentada a revisão contratual extrajudicialmente, e que a mesma foi recusada, ou simplesmente não respondida pelo locador; e
  • nos casos em que o contrato foi renovado no período da pandemia. E isso porque, o Magistrado pode entender que não há uma causa inesperada superveniente à contratação a ensejar o desequilíbrio contratual e, com isso, entender que não há motivo para a revisão contratual embasada na alta do IGP-M.

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